Na língua dos negros, quilombo significava povoação, capital, união; no Brasil, significava também local de refúgio. Os quilombos eram divididos em aldeias de nome mocambo. Seus integrantes eram chamados quilombolas, calhambolas, mocambeiros. Por volta de 1590 uma notícia assombrou a Capitania de Pernambuco.
Um grupo de quarenta escravos havia se amotinado em um engenho de Porto Calvo, em Alagoas. Foi um banho de sangue. Eles mataram amos e feitores, puseram a casa grande abaixo, queimaram plantações e fugiram sem deixar vestígios. Mais tarde, descobriu-se o paradeiro dos revoltosos. Eles estavam na Serra da Barriga.
Escondiam-se dentro de uma mata cerrada e andavam bem armados. Aquele ousado grupo era o começo do Quilombo dos Palmares. A mais impressionante comunidade de escravos fugidos neste país. Palmares foi uma nação completa, um Estado negro onde se falavam dialetos africanos bantos. Uma comunidade econômica que se manteve auto suficiente por mais de um século. Uma sociedade multirracial na qual eram aceitos índios e brancos perseguidos pelo Estado colonial.
Um país dentro do Brasil que abrigou 30.000 habitantes, a sexta parte da população da época. Lá não havia fome. Palmares, chamada por seus habitantes de Angola-Janga (pequena angola), era uma terra cheia de farturas. Plantavam, pescavam, e caçavam, muitos moradores eram hábeis artesões e conheciam a metalurgia. O excedente da produção era comercializado nos vilarejos. O quilombo de Palmares era uma pequena África onde os negros procuravam resgatar suas raízes, inclusive abandonando os nomes recebidos dos escravistas e trocando por outros de origem africana.
À frente desse povoado estava Ganga-Zumba e nas pequenas aldeias lideravam chefes locais. Nos seus 100 anos de existência Palmares sempre viveu a violência, as tentativas de invasão eram constantes. Quando os holandeses invadiram o Brasil, por volta de 1640, esses ataques diminuíram muito; os colonos portugueses estavam mais preocupados em defender o território das ameaças externas. E foi nesta época que o quilombo mais se desenvolveu.
Após a expulsão holandesa em 1654, uma verdadeira campanha contra Palmares se fez surgir. Dezessete expedições organizadas por vilas próximas, bem como pelo próprio governo de Pernambuco, embrenharam-se pela mata para derrubar os palmarinos. Havia motivos de sobra para que o governo colonial quisesse destruir Palmares.
Os burocratas e senhores de engenho não gostavam do mau exemplo daqueles negros livres andando por ali, fora isso eles saqueavam os engenhos e comércio, seqüestravam mulheres, matavam os brancos e, havia mais o dinheiro... Vender escravos era um bom negócio e ali em Palmares havia uma fortuna. Em 1677, um tal Fernão Carrilho, exímio caçador de negros entrou em ação. Marchando contra Palmares com seus combatentes, conseguiu derrubar alguns chefes de mocambos e matar alguns quilombolas. Neste ataque, Ganga-Zumba foi ferido, mas ainda assim conseguiu fugir.
Em decorrência disto foi obrigado a aceitar um tratado de paz proposto pelo governador do estado em que se prometia liberdade apenas aos nascidos no quilombo. Desmoralizado por aceitar a proposta, Ganga-Zumba se viu diante de uma operação dos quilombolas organizados para depô-lo, sob a liderança de Zumbi, que neste momento se tornou o líder maior do quilombo. Os senhores de engenho não aceitavam as perdas dos escravos e o governo colonial não suportava mais tanta derrota. Foi quando contrataram o bandeirante paulista Domingos Jorge Velho conhecido por ser grande desbravador e grande assassino.
Sobre este paulista, em 1697, escreveu o Bispo de Pernambuco: "Este homem é um dos maiores selvagens com que tenho topado... tendo sido sua vida, desde que teve razão (se é que teve, de sorte a perdeu tanto que entendo não a achará com facilidade) até o presente, andar pelos matos à caça de índios e índios, estas para o exercício das suas torpezas e aqueles para o granjeio de seus interesses". A primeira vez que subiu a serra da Barriga em 1692, Domingos Jorge Velho levou um susto. Macaco, a capital do quilombo havia se transformado numa cidadela fortificada. O bandeirante só voltou dois anos depois com 9.000 homens, seis canhões.
O cerco durou 42 dias e na madrugada de cinco de fevereiro, os invasores finalmente romperam a resistência do quilombo. Mais de 400 guerreiros foram mortos no local, metade empurrada pelo despenhadeiro. Milhares fugiram para as matas, porém quase todos foram capturados e muitos degolados.
Palmares foi inteiramente destruída. Zumbi conseguiu fugir, mas morreria um ano depois em uma emboscada. Nas cidades o fim do Quilombo dos Palmares foi festejado, o governador da Capitania de Pernambuco mandou rezar missa solene, encheu Olinda e Recife de lanternas e jogou dinheiro para o povo das janelas do palácio. ...Porém nas senzalas, não se festejava nada.
O sonho de liberdade só viria chegar ali 200 anos depois.
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